02 julho 2016

Nua | A menina que não tinha curvas (Parte 1)

Antes de entrar no banheiro, inspirei fundo, soltando o ar pela boca, lentamente. Abri a porta e a tranquei em seguida. Tirei a camisa, o sutiã, desabotoei a calça e, antes que eu ligasse o chuveiro, notei que havia deixado a muda de roupa no chão, o que me fez voltar e coloca-las no cesto de roupa suja. Quando curvei o corpo para que minhas mãos alcançassem as roupas, senti as dobras da barriga se expressarem mais e toda a flacidez da minha pele.
Toda essa situação de ter um espelho que permita reflexo de boa parte do banheiro tornava mais complicado o fato de se ver nua. É difícil olhar e perceber que aquilo é você mesma. "Como alguém poderia gostar de mim ao ponto de querer ser minha amiga?", "devo ser engraçada pra chamar atenção das pessoas", pensava.
Liguei o chuveiro e me vi deixar ser molhada, como alguém que se deixa levar por uma ventania qualquer. Ali, encharcada, entendi a vida sendo limitada como uma piscina, em que todos nadam no mesmo estilo, com o mesmo objetivo de chegar até o fim da raia. Eu era uma dessas pessoas, mas não sabia bem aquilo que queria. Por isso, nadava sem coordenação, invadindo o espaço dos outros e levando chutes na cara sem entender o por quê.
Da micro janela do banheiro, entrava um pouco da luz alaranjada do sol das cinco e meia, me chamando para vê-lo partir. Logo me enxuguei e fiquei pronta, sentindo a brisa e a calmaria pela varanda do meu quarto. Gostaria que o dia inteiro fosse leve como naquele horário. Escuto menos barulho de carro, vejo pássaros planejarem a noite e a lua nascer das árvores que ocupavam parcialmente a minha visão.
Em mim vivia constante o raio do meio dia, que arde e agoniza quem está debaixo dele, como eu que tentava usar um guarda-chuva para fugir do meu próprio sol.
Andava apressadamente, empurrando o chão com os dedos dos pés e, quando percebia a barriga e os seios em movimento, parava. Eu vivia parando no meio do caminho e sempre achava que o sinal abriria na exata hora em que colocasse meus pés na faixa de pedestre.
Dou um passo para frente com dificuldade. Esse negócio de andar me cansava a alma, suava o corpo. Tudo o que me fazia suar tinha minha repugnância conquistada, porque o suor me lembrava que tenho um corpo e ele está ali, existindo comigo, de maneira feia.
Queria sumir, em especial no verão, quando meus pais me arrastavam para uma praia chata num lugar chato, onde as pessoas exibem seus corpos que brilham, como seus sorrisos brancos, seus cabelos sedosos. São pessoas que correm sem se preocupar com alguma coisa, têm suas vidas saudáveis, preenchidas por bons momentos. Claro que nem todo mundo tem a vida perfeita, mas ser daquele jeito parecia um caminho.
Nesse período do ano, mamãe costumava checar tudo para que nada de ruim ocorresse durante a viagem, por falta de planejamento. Portanto, faz-se necessário pontuar que corresponde a minha mãe determinadas características, uma delas é priorizar coisas completamente desnecessárias, ao meu ver, como comprar uma mala nova (e rosa) pra mim quando já se tem uma ótima.
Para comprar essa mala (e rosa), precisei ficar, sem energia alguma, duas longas horas dentro de um shopping no qual, provavelmente, muitas pessoas não estavam ali com objetivos necessários ou fazendo algo que realmente precisassem fazer. Eu preferia me esconder dentro de um guarda-roupa do que lidar com pessoas me olhando e reproduzindo, mentalmente: Que coisa estranha. Essa garota é feia e gorda. – ao menos era isso que eu imaginava.

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