03 julho 2016

Observada | A menina que não tinha curvas (Parte 2)

Seguida de olhares estarrecidos, era hora de despedir-me da mamãe no meio daquela gente toda e seguir sozinha para casa, pois ela disse estar em tempo de ir ao centro da cidade resolver coisas que não necessitavam a minha presença. O alívio se manifestou no relaxamento da minha postura quando ela me disse até logo, mas rapidamente me dei conta de que estava sozinha, então tornei a ficar contraída e tensa de novo.
É complicado lidar com pessoas quando você não consegue lidar consigo mesma. Estar numa parada de ônibus, com carros e pessoas passando, observando minha feiura, me olhando indiscretamente, querendo dizer que eu deveria ser magra, que deveria fazer um clareamento nos dentes, tratar o cabelo, fazer uma limpeza de pele e, quem sabe, uma boa e intensa depilação. A propósito, não entendo como parece ser tão natural abrir as pernas para alguém que você mal conhece. Mas eu faço isso quando minha mãe me carrega para o salão e marca um horário sem me avisar.
Evitando desvios, preciso dizer que além dos olhares das pessoas, as suas frases implícitas, suas imagens expostas que vendiam a felicidade, suas revistas, seus programas na televisão, suas fotos na internet, me diziam como deveria ser meu nariz, meu cabelo, minha barriga, o formato do meu rosto. E isso tudo me transformava em um passarinho retido no seu próprio ninho, porque cresceu numa tribo que não lhe permite voar, que não lhe permite a propriedade natural e tenta selecionar aqueles que os convém.
Não sei quem começou a estruturar a ideologia sobre o físico desse mundo maluco onde vivo, mas graças a isso, nunca foi tão complicado o amor, seja ele por mim ou por outra pessoa.
Parte 1: leia

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